Para a maioria, uma campanha fracassada de crowdfunding seria uma vergonha a ser escondida. Mas não para Pascal Cammisotto. Depois de sua campanha no Kickstarter para o financiamento de uma sequência para o popular There Is No Game, de 2015, arrecadar apenas 10% do necessário para a sua produção, o desenvolvedor reestruturou sua estratégia e, depois de alguns atrasos, entregou um produto muito melhor do que o imaginado. E, ainda por cima, fazendo piadas com sua campanha fracassada.

There Is No Game: Wrong Dimension é um jogo de aventura point-and-click e puzzle de comédia desenvolvido pela empresa de Cammisotto, a Draw Me A Pixel. Ele foi lançado em 6 de agosto de 2020 para PC, e está programado para lançar no dia 17 de dezembro para iOS e Android. A narrativa dessa sequência começa de uma forma muito parecida com a do primeiro jogo — uma tela de título e um narrador negando que haja qualquer tipo de jogo ali. Um conhecimento superficial do não-jogo anterior pode te ajudar a passar pelos primeiros desafios, mas quando o enredo começa a engrenar de verdade, ele se torna algo completamente diferente. A história é dividida em capítulos, cada um representando uma dimensão diferente onde o jogador (usuário) e o narrador se encontram na incessante busca para voltar para casa.

O usuário e o narrador viajam por diversas dimensões durante a trama.

Essa divisão em capítulos permite que as mecânicas, visuais e piadas continuem sempre se renovando e impede que se tornem maçantes. Também permite ao desenvolvedor fazer comentários sobre diferentes estilos de jogo. Em vários pontos da trama, ele faz comédia em cima de jogos retrô de aventura, como os antigos The Legend of Zelda, de jogos de point-and-click, de jogos free-to-play para celulares, entre vários outros. Algumas piadas são recorrentes através de todos os capítulos, e enquanto algumas são bastante engraçadas e me fizeram rir sempre que apareciam, outras acabavam irritando mais do que divertindo, por serem apenas repetições da piada sem qualquer mudança. Algo que se mantém constante por todo o jogo é a sensação de estar jogando pelos “bastidores”, como se estivéssemos assistindo alguém jogar enquanto mexemos na jogatina por trás das cortinas.

Todas as mecânicas de There Is No Game: Wrong Dimension giram em torno de pensar fora da caixa. Isso, porém, pode ser difícil às vezes. Felizmente, o jogo oferece um sistema de dicas que não te penalizam caso utilizadas; a única desvantagem de utilizá-las é ouvir as vaias que soam quando o jogador clica para revelar uma delas. Sendo assim, é praticamente impossível ficar “preso” em uma seção do jogo, permitindo que o enredo flua de forma orgânica. Um pequeno detalhe que acabou me incomodando ao se repetir de novo e de novo é o efeito de “tremer a tela” que ocorre sempre que um dos itens é solto pelo jogador. Isso faz sentido quando esse item é uma placa de metal, por exemplo, mas quando é literalmente uma pena, acaba se tornando um efeito irritante e atordoante.

O jogo oferece uma ajuda para que a narrativa continue em um ritmo orgânico.

Todo o jogo é narrado pelo personagem do narrador, que é dublado pelo próprio Pascal Cammisotto. É natural que, como um desenvolvedor de games, ele não seja muito habilidoso como ator, mas isso se torna particularmente evidente em cenas onde ele deve contracenar com uma outra personagem — a GiGi — que, dublada por uma atriz profissional, ofusca-o. Ela, aliás, faz um ótimo trabalho e é uma das maiores qualidades deste jogo. Falando em GiGi, ela tem seu clímax narrativo durante uma canção cantada por Julie Shields, sua dubladora, que parece ter saído de um filme de James Bond. Ela representa bem a atenção dada pelos desenvolvedores à trilha sonora, que nunca decepciona. Não só marcando o momento que mais me emocionou, ela também marca o momento onde eu mais ri. Não quero dar spoilers, mas o narrador acaba se encontrando em uma posição indesejável e é forçado a cantar. O que se segue é absurdamente hilário.


Conclusão

Com reviravoltas inesperadas, piadas hilárias e mecânicas inovadoras, There Is No Game: Wrong Dimension é indubitavelmente um dos jogos mais excêntricos e inigualáveis já lançados.

(cópia para análise gentilmente cedida pela Draw Me A Pixel)